28 abril 2013

cartas de amor e ódio

lá na folha, o jornal velho, leio que serão lançadas, em edição comemorativa, as cartas de Graciliano Ramos e que nelas veremos um Graça mais simpático, ameno e menos taciturno, tudo para quebrar a imagem antiga de  autodepreciativo, amargo e casmurro do autor de Angustia. Livro esse, que ousei dá de presente a uma amiga porque cairia no vestibular da época em Minas, no que recebi de volta, um lacônico "já imaginei que seria essa a tua opção", em tempos, pelo livro dado, mais uma evidência da minha auto-angustia. Algo como saber a cura para asma sem saber respirar. Nada nessas cartas do autor de São Bernardo deveria servir de base para nada, 125 cartas, um pouco mais, um pouco menos, selecionadas a dedo para comprovar ou negar uma tese, é pouco, é quase uma má fé, não é sério ou informativo em algum sentido válido. No entanto, pomos nossas fichas, de leituras e crenças, nessas constatações de especialistas, nessas esperanças vãs, não ousamos usar o cérebro que pensa e que é lento e grande consumidor de energias, nos enganamos com as evidências nenhuma, na esperança de não sermos como o Graça, casmurros de tanto pensar, exaustos e esquálidos e de eterno mal humor por nada entender ou saber, mentem todas as estúpidas cartas de amor, diria o Pessoa, mentem mais ainda se são poucas e escolhidas ao doce sabor das intenções. Verdades nenhuma escondem, apenas, talvez, inconfidências que nos alegram porque são quase verdades alheias, não nossas. Infelizmente, vale o mesmo para as opiniões sobre quase tudo, desde o libertarismo inconsequente da casa sem impostos ao estatismo da minha casa minha vida, ou os juros baixos do banco do brasil, do Brasil, eu disse, enganam e mentem como todas as cartas de amor e ódio, são peças publicitárias, peças de campanha para atrair adeptos e seguidores, todas incrivelmente lenientes e inconsequentes no seu ódio à verdade, qualquer uma...

21 abril 2013

jovenismo patriota e o oportunismo acadêmico

 "Vejo a natureza como uma estrutura magnífica que podemos compreender apenas imperfeitamente e que deveria inspirar em qualquer pessoa com capacidade de reflexão um sentimento de humildade" (Einstein, lá na coluna do Gleiser da fsp) 

o epigrafe fala por si mesmo, mas lembrei, ou melhor, ele, o epigrafe, me fez lembrar da controvérsia da semana, o erro no uso da base de dados e na aplicação das fórmulas do excel e, por consequência, nas estimativas econométricas da correlação entre crescimento e dívida pública e do suposto ponto de inflexão, na casa dos 90% do PIB, quando toda a maionese desandaria, Rinhart & Rogof, (veja um bom resumo aqui), versus os estudantes de doutorado Herdon, Ash e Polin, que perceberam o erro na condução dos cálculos. Sem entrar em detalhes, assustou-me as reações, que se seguiram ao episódio,  na minha TL, lógico, dois caminhos clássicos e, ambos, equivocados, completamente equivocados:
  1. não precisamos da econometria de Harvard(sic) e da estatística sofisticada, muito menos precisamos de evidências ou de algoritmos para analisar uma massa de dados gigantesca e  microdados do censo, podemos, nós os estupendos alunos de doutorado, chegar a conclusões ainda mais inteligentes, usando apenas excel e matemática elementar...(essa é minha leitura de um meme que circulou nas redes sociais, que, infelizmente, não consigo transpor para cá). Não preciso explicar o equivoco ignorante que essa forma de reação inspira, uma mistura de achismo com ideologia radical, nada mais, aliás,  isso é treva.
  2. a outra reação é a ainda mais estapafúrdia,  como os autores do erro defendiam austeridade fiscal para combater a crise do euro e eles estão errados nos cálculos do seu famoso artigo, logo, podemos concluir, apressam-se os mesmos do item anterior, que a hipótese de usar austeridade como combate a crise foi, e está, completamente refutada, e, por conseguinte, a teoria oposta, que defende políticas pró-cíclicas de estilo keynesiana de multiplicador elementar e linear, está correta e deve ser seguida como deseja toda a heterodoxia global. 

non sequitur clássico esses dois raciocínios são a fina flor da sandice ou da má fé e levaram analistas importantes e até alguns laureados a perderem o meu respeito e admiração, temos aqui, alinhados, oportunismo e cinismos combinados ao `jovenismo`essa tríade  explica a patotada, ou patriotada da semana, (expressão que, no caso brasileiro, assume ares de irresponsabilidade democrática), em cima de um erro assumido pelos próprios autores.

14 abril 2013

O cachorro sem dono...

o aeromóvel chegou, sim, Porto Alegre terá um, melhor, terá dois, o primeiro lá está, trinta anos e nunca saiu do lugar, esse novo, sairá, servirá para atravessar duas pistas largas do aeroporto até a estação do metrô de superfície, um ridículo a mais, uma sem sabedoria sem fim, uma paisagem de ficção no meio do Salgado Filho, o aeroporto. Atende ao projeto de maquiagem da cidade para a copa, um muro a mais de desatinos a revelar as opções que fazemos em nome da Copa do mundo de futebol e do bolsa família, algo sui generis, somos a classe C que ainda observa extasiados a aviões pousando e decolando e que ainda caminhamos nos parques povoados de cachorros sem donos que fazem suas necessidades nos nossos pés, mas temos o aeromóvel, a classe c e o bolsa família, 900 metros, um pouco mais, a distância que a peça irá transpor para levar os turistas e os jornalistas, a mesma distância que precorro, ou tenho que percorrer, para pegar um ônibus de linha ás seis da manhã, um pouco mais, um pouco menos, poucos dias ou vezes, é verdade, vou por uma rua quase deserta, pelo meio da rua, para evitar ou tentar evitar os cachorros sem donos, na minha fantasia de medo, lobos e matilhas com um ou dois alfas a perseguir seres magros e de olhos verdes, todos lobos, dentes de lobo no meu destino, sem donos, os cachorros gastam os impostos em aeromóveis, mesmo sabendo que os cachorros vagueiam pela cidade a cata de trabalhadores da educação pública, de qualidade e gratuita só no jargão clichê dos intelectuais do b, porque, a julgar pelos ônibus lentos e que percorrem muitos quilômetros antes de chegar a santa casa, somos os verdadeiros  cães sem dono, mas a cidade orgulha-se de ter um aeromóvel, o bolsa família e a classe c, todos educados e muito politizados...

09 abril 2013

os senhores dos anéis, os outros...

Hoje fomos surpreendidos com a noticia da comitiva de economistas que fez visita, a convite, à nossa presidenta, o ex-ministro Delfim Neto, o ex-presidente do Palmeiras, Beluzzo e o ex-secretário da Fazenda do Governador Mario Covas, Nakano. A minha primeira reação foi de tristeza e agonia, o tema a ser tratado era inflação no Governo do PT e da Dilma, bem, qualquer analise equilibrada e honesta da história recente do país apontaria a irresponsabilidade e a temeridade de convidar esses três senhores para qualquer conversa sobre esse e outros temas econômicos, principalmente se o convite parte de alguém que precisa tomar decisões e precisa de conselhos válidos. Contudo, depois, mais resignado e cansado, passei a reconhecer a importância da visita histórica, a retórica dos três, melhor, dois dois primeiros, é capaz de convencer qualquer um de que estamos no melhor dos mundos e de que temos que aprofundar o corte de juros, o incentivo ao crédito  e à demanda interna e que os gastos públicos crescentes devem liderar a retomada dos investimentos para a reeleição já em primeiro turno. A Hidrobrás é apenas o começo de uma quebra de paradigmas pró e re-estatizante, afinal, o mundo precisa de um capitalismo brasileiro de Estado para voltar a crescer, segundo esses grandes economistas de inestimáveis serviços prestados ao país. Imagino as gargalhadas e as piadas em relação aos economistas que pensam diferente e as, impagáveis, intervenções do ministro da Fazenda, uma inteligência vital e fundamental para o novo desenvolvimentismo que vai mudar a vida da classe média, da classe C e dos que abandonaram  a estupenda linha de pobreza na casa dos R$ 70,00. Quanta felicidade num encontro só, quanta sagacidade orgânica e citações eloquentes, duas ou três frases espirituosas do e sobre Keynes, uma breve, mas também eloquente alusão a novíssima biografia de Marx e uma recomendação para ler também a biografia do Chávez,  tudo entre canapés, tapetes vermelhos, só os pés descalços da anfitriã, bolorentos e sobre a mesa de tampo de vidro transparente, destoavam do tom erudito do encontro dos  sábios da República velha. Amanhã acordaremos mais ricos, menos vulneráveis e solenemente felizes, caminharemos para a glória do povo incluído e ungido pelos melhores ventos da suprema sabedoria nostálgica e de rapinas. Afinal é um luxo podermos contar com um conselho de notáveis tão expressivo e articulado, uma glória.